MINHAS PRÓXIMAS CORRIDAS

domingo, 30 de setembro de 2012

UMA CRÔNICA DE PRIMAVERA....

Não importa a distância, quantos metros ou mil metros cada um vai percorrer. 
Importa o que cada centímetro, o que cada passo, o que cada gota de suor 
significam para quem os está experimentando.



Corredores Capixabas reunidos para um treinão (30/09/2012)


E a crônica nasce assim: numa manhã de domingo que tinha tudo para ser nublada, triste e que, pelo contrário, surge linda!!! E não só pelo céu azul e o sol prometendo fazer arder os poros, mas pelos encontros a se realizarem... Encontros de pessoas que possuem em comum pelo menos um ponto: a paixão pela corrida... Somente essa paixão para reunir, antes das 8h da manhã de um domingão, mais de 60 pessoas... Somente esta afinidade para alguém que só esteve com você uma única vez lhe oferecer uma carona e ainda buscar você em casa... Ou fazer uma sainha especial para a próxima corrida... Algumas pessoas vão chegando tímidas, primeira vez entre aquela galera...Outras vêm fazendo barulho, bem populares e queridas... Ainda outra que se aproxima e se apresenta: "Olha, já comentei lá no seu blog..." Outros que observam mais afastados, em grupinhos que logo se abrem, fundindo-se no grupão...

 
E parte aquela turma pelas ruas afora... Alguns buscando parceiros de ritmo e quilometragem... Outros se conhecendo... E rola um bate-papo que segue em cadência com os passos que acabam sendo sincronizados... Vocês já pararam para ouvir a música dos passos de corredores que seguem juntos, em mesmo ritmo? Quando o silêncio impera, em momentos em que a cadência acaba sendo mais forte? Você acaba sendo levado por aquele som e segue na frequência, numa dança ao mesmo tempo particular e compartilhada, em que corpos, corações e mentes seguem juntos por alguns instantes...

E cada um segue em busca da distância almejada... 5 km? 8 km? 10 km? 12 km? 15 km? 18 km? Que importa? O que vale é que respeitemos nosso corpo, nosso condicionamento... O grupão vai se fragmentando por alguns minutos... Passamos por um, por outro, até encontrar alguém que acompanhamos... Seguimos: retas, curvas, subidas e descidas... De repente, num intervalo entre as sincronias, um desabafo... E você descobre alguém que entende o que você sente, sabe - porque também vive - as angústias diárias que a vida nos proporciona... As cobranças pessoais, as cobranças sociais... Ah, essas cobranças pessoais!!! E seguimos, em passadas cada vez mais firmes, com a alma mais leve... Agora confidentes de um sentimento tão próximo... E são mais retas,  e mais curvas, e mais subidas, e mais descidas...

Aos poucos vamos terminando o treino, cada um cumprindo aquela meta do dia... Corpos suados, poros em transpiração excessiva, sorrisos nos rostos... O grupão vai se refazendo aos poucos, novamente. E chega um, e outro, e mais um, e mais outro... E o bate-papo, o relaxamento, as trocas de experiências...

Tudo isso é motivação... E precisamos de motivação para seguirmos em busca de nossos objetivos... Porque nem sempre é fácil... Vocês sabem, por mais prazerosa que a corrida comece a se tornar, é uma desestabilização do corpo em repouso... No início, dói tudo... E, quando nos acostumamos, forçamos um pouquinho mais, e dói mais um pouquinho... Vai entender essa paradoxal necessidade que sentimos de querer sempre um pouquinho mais, mesmo sabendo que o esforço será maior... Sim, precisamos de motivação... Às vezes é a rotina que vem nos atropelando e quase nos levando em seu ritmo acelerado... E precisamos insistir para não perdermos o ânimo...

E às vezes a motivação vem assim - de um comentário como o que recebi ontem em uma crônica anterior: "Com seus posts, dá vontade de largar tudo e começar logoooo!!! Obrigada por me motivar tanto!!!" Puxa, Eliza Karla, eu é que me sinto motivada a escrever mais quando alguém fala assim para mim. E a correr mais também, porque o SUOR e a POESIA que eu procuro deixar por aqui são despertados pelas passadas compassadas que dou por aí em companhias tão lindas... Eu é que agradeço a vocês, corredores capixabas, por fazer parte de um grupo tão lindo!!!
                                   Com Eliza Karla


'Bora rezar para a semana passar rapidinho? Afinal, domingão que vem tem mais!!!!
'Bora correr, meus queridos!!! 'Bora viver!!! 'Bora ser feliz!!!!

sábado, 8 de setembro de 2012

COM SABOR DE CHOCOLATE

                                                           O que dizer do prazer de receber amigas em casa,
de rever amigos corredores, 
de me sentir cada vez mais à vontade 
na nova terrinha?  
                                                         
                            Apontando para a direção da minha casa, a um quarteirão do trajeto da corrida.


As 10 Milhas Garoto entraram em minha vida ano passado, quando, ainda morando em Minas Gerais, vim em caravana correr esta prova. Achei uma corrida linda e já planejava voltar este ano... Apenas não  podia imaginar que, menos de um ano depois, eu estaria morando em Vila Velha, bem pertinho do trajeto das 10 Milhas... E este ano o sabor da corrida foi mais adocicado... E nem foi por causa do chocolate, foi mesmo o sabor das amizades... 

Nesta minha breve vida de corredora, 2 anos e 6 meses, eu fiz amigos que me recebem em suas casas quando eu vou correr na cidade deles. É sempre tão gostoso, me sinto tão bem entre eles! Possuímos afinidades, tornamo-nos confidentes e cúmplices... E a corrida acaba nos propiciando lindas amizades, que vão se fortificando a cada dia... Este fim de semana tive o prazer de, pela primeira vez, receber duas amigas  corredoras em minha casa. Não é questão de retribuir o que tenho recebido, mas de compartilhar o prazer de instantes juntas... Apesar de uma breve estadia, pudemos passear um pouco, conversar, irmos juntas ao jantar de massas e à corrida...
Com Gleice Medeiros e Raquel Pinheiro...

E estes instantes foram vividos também com outros amigos que estiveram na cidade: amigos de Juiz de Fora, de São João del-Rei, do Rio de Janeiro... O círculo de amizades vai só aumentando... E os amigos dos amigos vão se tornando nossos amigos também... Essas relações que vão se estabelecendo não têm preço... Estar numa corrida de porte médio, digamos assim, como a da Garoto, e reconhecer várias pessoas é muito satisfatório... 

E o prazer de ser parada na rua por algum corredor se apresentando, dizendo que está no meu face, segue meu blog, curte minhas postagens, minha história e que se sente motivado com elas? Puxa, isso tudo me faz mais forte para me manter firme em meu caminho... Não é fácil perder 30kg e me manter no peso... Nem sempre é fácil manter uma disciplina de treinos, considerando os compromissos profissionais... Não, nada disso é fácil; mas quem corre, quem já fez da corrida uma paixão, um estilo de vida, vê sentido em cada esforço realizado para treinar. E aqueles que se dizem motivados por mim não sabem a motivação que me transmitem...

E ali, naquela manhã de domingo, nas terras da Moqueca e da Garoto, éramos todos iguais... Formávamos uma grande comunidade de corredores, tomando as ruas de Vitória rumo à Vila Velha... Formamos um mar de camisas amarelas, salpicado de algumas gotas multicoloridas, das diversas assessorias que se fizeram presentes. E era um mar tão bonito!!!. Um mar que foi invadindo a 3a ponte e passou por cima dela... Tomou conta de toda a pista.. Seguiu em ondas que se movimentavam ora mais rapidamente, ora mais lentamente... Um mar de pessoas guerreiras, que mais um dia venciam o sedentarismo, que enfrentavam o calor capixaba e a subida da ponte para celebrar a vida... 

Esse mar de corredores, quando desaguou em Vila Velha, foi se espalhando por suas ruas, tomando a direção da fábrica de chocolates... E era lindo, ao dobrar as ruas, encontrarmos os moradores da cidade vibrando com nossa passagem... Vibravam... E eu pude, em meio a tantas vibrações, identificar a de um ex-aluno ao me ver passar...  Ele, que havia corrido a Garotada, estava ali, apoiando os adultos que corriam... 

E em ondas seguíamos... Em ondas íamos sendo levados... Em ondas atravessávamos a linha de chegada... E quando as ondas ali quebravam, respingavam corredores para todos os lados... Eu procurei estar alguns segundos com alguns amigos que chegavam... Queria abraçá-los, parabenizá-los, dizer que estávamos juntos, que ali éramos todos iguais... 
 Com Nonô Xavier...

Com meu aluno Bruno de Andrade...

Com Priscila Angeli...

 Com Taíssa Gomes...

Com Ignez e Denilson...

Com Maurício Vivas, Andrea Marins e Raquel Pinheiro

Com Tatiana Yuri e Rowena Tabachi...

Com Jamili Saade...
Com Aparecida Sandim...

Com Raquel Pinheiro, Gleice Medeiros e Gedair Reis...

 Mineiros e cariocas...

E foi uma linda celebração!!! Para alguns, um sonho realizado...Para outros, um recorde temporal conquistado... Para alguns, a superação da sede, da dor, do cansaço... Para outros, um passeio num cenário  grandioso... Para todos: uma medalha no peito - que, muito mais do que um objeto na parede, é um símbolo que se preenche de histórias... Cada um com a sua história... A história que se camufla na minha medalha é esta que você acabou de ler... Cheia de doçura, com sabor de chocolate... E a sua, qual é? Compartilha com a gente, deixando um comentário: o que a Garoto significou para você???



CRÔNICA PUBLICADA NA REVISTA "BORATREINAR", EDIÇÃO DE SETEMBRO




A partir dali, foi só emoção... 40km: e chovia e ventava... 41km: e chovia e ventava... E havia um nó na garganta... 42km: e chovia e ventava... E, enfim, não contive mais minhas emoções: eu chorava... Os 195 metros restantes foram percorridos com o coração, com a emoção, com uma sensação que não dá para descrever... Somente quem sonhou, treinou, doou-se de verdade, sentiu medos e dores é capaz de entender essa sensação... E eu atravessei a linha de chegada... E havia água fria pelo chão e pelo corpo, e gotas de água quente escorrendo pelo rosto...




Etapas... A vida da gente é feita de etapas, e na corrida não é diferente. Estreamos em quilometragens pequenas, tomamos gosto por participar de provas, estabelecemos novos objetivos e...  “boratreinar” para buscar alcançá-los.  E cada etapa conquistada é uma vitória diferente, tem um sabor especial, um significado único.  A autoconfiança vai aumentando, a euforia vai tomando conta, as medalhas e as histórias vão se somando. E, para quem está começando, o percurso de 5km parece tão distante dos tão falados 42,195km de uma maratona... Mas nem por isso são menos difíceis...

No entanto, é só ir visualizando os degraus seguintes, cumprindo as etapas (cada corredor no seu tempo, de acordo com suas necessidades, respeitando o corpo), que a escalada rumo à maratona  se torna possível. Começamos por provas de 5/10km, passamos para uma meia maratona, às vezes intercalamos alguma prova de 10 milhas e, tradicionalmente, os 42km se tornam o próximo degrau a ser almejado por alguns... E é possível chegar a este topo, meus queridos leitores. Sim, é possível! E aos poucos a gente vai treinando, vencendo quilometragens nunca antes percorridas e vendo que o maratonista é um corredor como nós mesmos: ele percorre as ruas, os asfaltos, as estradas, as ladeiras, faz treinos de velocidade, transpira, sente dor, medo, insegurança, ansiedade... Os maratonistas são apenas um pouquinho mais “loucos”...

Ter completado minha primeira maratona, em julho, no Rio de Janeiro, foi uma realização a que não comparo nada do que já fiz até hoje. Ah! Todos nós, “loucos” que corremos, sabemos que precisamos de disciplina, determinação, disposição para queimar muito asfalto, se quisermos alcançar nossos pódios pessoais. E este “pódio” da maratona é simplesmente inesquecível. Enquanto eu percorria aqueles quilômetros que pareciam intermináveis, quando a dor muscular e o cansaço começavam a falar forte, eu me lembrava de toda a dedicação, de todo tempo empregado para me preparar para estar ali, encarando aquele percurso, tentando realizar meu grande sonho para 2012. Foram seis meses de vida  voltados para a Maratona do Rio, da inscrição aos últimos treinos. Foram muitos longões, muita abdicação para chegar até lá... Foram muitos medos, muita ansiedade... Muito controle psicológico também...

Mas valeu a pena cada gota de suor transpirado, cada centímetro percorrido durante os seis meses de preparo, cada contração muscular, cada cansaço físico após os intermináveis longões...  Vale a pena, meus amigos corredores! Vale a pena sonhar, traçar planos, se programar para alcançar o objetivo...   Vale a pena a autossuperação, a autodisciplina... Vale a pena atravessar as linhas de chegada, olhar para trás e dizer para si mesmo:  “Eu sou um vencedor!!! Eu sou um vencedor e faria tudo outra vez!!!”

Ora, não foi isso que vocês sentiram quando atravessaram suas primeiras linhas de chegada? Vocês se lembram dos seus primeiros 5/10km?  Lembram-se da primeira medalha no peito? Aquela sensação indescritível se repete a cada novo degrau alcançado... Os pódios interiores não medem a quilometragem, são resultado de superações que só nós mesmos sabemos que conseguimos alcançar... E esses pódios possuem um valor que nada nem ninguém pode calcular por nós...

É para experimentarmos sensações indescritíveis como essas que eu sempre “grito”: ‘Boratreinar, corredores? ‘Bora correr, amigos? ‘Bora viver, meus queridos leitores!

domingo, 5 de agosto de 2012

CRÔNICA DE UM INVERNO CALOROSO



O que vale mesmo nesta vida de corredor
 são as pessoas que vamos conhecendo 
pelos quilômetros afora... 
As medalhas ficam nas paredes, 
os troféus ficam empoeirados, 
mas as histórias vividas não se apagam... 
E não há boas histórias sem bons personagens...





Meses de julho e agosto... inverno? Frio? Vontade de ficar em casa agasalhado??? Que nada!!! Nesta terra da Garoto e da Moqueca tenho conhecido pessoas que fazem o inverno capixaba tão quente quanto o verão. E olha que quando eu me mudei me disseram que o capixaba não é um povo acolhedor... O capixaba "normal" pode até não ser, mas os corredores capixabas (aliás, os corredores de modo geral) são muito acolhedores. Sinto-me, entre eles, como se já os conhecesse há tempos, quando, na verdade, estivemos juntos pela primeira vez há apenas 8 dias...

O clima daqui já é quente por natureza: o sol esquenta, faz ferver o sangue que já corre descontrolado na corpo do corredor... O céu é de um azul tão puro, que as nuvens parecem tímidas, receosas de aparecerem... E a morada de Iemanjá resplandece toda sua beleza e imensidão... E neste cenário inspirador,  os corredores começam a aparecer: chega um, outro, e mais um e mais outro e, de repente, se alguém grita a palavrinha mágica: "foto", eles se multiplicam... Parecem vir de todos os lados (não sei se saem do mar, se brotam da areia, se materializam-se instantaneamente) e, como num passe de mágica, a foto fica pequena para tanta alegria...

A corrida começa, cada um segue seu ritmo, vai tentar alcançar seus sonhos: diminuir tempo, completar um nova distância, vencer a barreira do sedentarismo, compartilhar os quilômetros com um amigo... Não importa o objetivo, não importa a distância, não importa o pace... Importa que ali somos iguais, sonhadores, lutadores, vencedores... E já corro em terras capixabas reconhecendo algumas pessoas pelo trajeto, assim como sendo reconhecida por elas... E é tão gostoso isto: um sorriso que a gente recebe pelo caminho, alguém que grita seu nome... 

Depois da corrida, há o reencontro: um aqui, outro ali, e mais um e mais outro... E alguém grita: "foto"!!! Pronto!!! A festa está novamente montada...


E estamos ali, participantes de uma mesma história, embora cada pessoa esteja escrevendo o seu enredo particular... Mesmo que a gente faça um papel de personagem coadjuvante na história do outro, é uma presença registrada... Mesmo que a gente seja o personagem principal da nossa história, as outras participações é que preenchem os espaços de nossa vida. Afinal, ninguém é alguém se estiver sozinho neste mundo... 

Obrigada, corredores capixabas, pela alegria que eu tenho encontrado entre vocês!!! 
'Bora correr, povo!!! 'Bora viver!!! 'Bora ser feliz!!!!








terça-feira, 17 de julho de 2012

DE SONHOS... E REALIZAÇÕES... UMA MARATONA VISÍVEL, MUITAS OUTRAS INTERNAS....

Quando comecei a correr, há dois anos e meio, 
trotando com dificuldade entre 4 minutos de caminhada 
e um de corrida muito leve, não imaginava, nem sequer sonhava, 
que chegaria aonde cheguei no domingo, dia 08/07: 
atravessar a linha de chegada de uma maratona....


Hoje, dia 17/07/2012, faz exatamente um ano que completei minha primeira meia maratona (ASICS Golden Four/BH) e, naquele dia, eu ainda não imaginava que um ano depois eu já teria completado minha primeira maratona. Esta, na verdade, começou a ser sonhada no fim do ano passado e passou a ser buscada com afinco a partir de janeiro, quando fiz a inscrição. Foram meses de empenho, de inseguranças, medos e euforias... Passei por crises emocionais, mudanças de Estado e de emprego, lesão no pé, mas uma única certeza me acompanhava: a gana de conseguir correr 42,195km. Com qual objetivo? O de vencer? Mas vencer o que mesmo?

"Qual foi  a sua classificação?" é uma pergunta que tenho ouvido com frequência quando mostro, cheia de orgulho, a medalha que simboliza esta vitória tão subjetiva. Desculpo as pessoas que me fazem essa pergunta, porque elas não sabem o que dizem... Não são corredoras, são daquelas que acham que corredor é louco e que parece não ter mais nada a fazer, quando contamos que fazemos longões que duram mais de 3 horas...

Na verdade, somos mesmo "anormais"!!!! Os que se acham "normais" preferem tecer críticas a saírem de sua zona de conforto entre o trabalho e a casa. São pessoas à beira de um estresse, que dizem não ter tempo para isso  que eu faço... Mas o que eu faço? Eu corro, eu sonho, libero endorfina pelo meu corpo, dou a ele sensações de bem-estar e saúde física e psicológica. "Correndo de quem?" - às vezes brincam... "Correndo de quê?" - eu completo. Da obesidade, do sedentarismo, de uma vida sem objetivos, entravada na engrenagem do dia a dia de um mundo capitalista. 

Ainda bem que eu e muitos outros ousamos ser "anormais" e estabelecemos o dia 08/07/2012 como data para realizar um grande sonho. E fomos à luta.... Foram treinos e mais treinos: longos, tiros, intervalados... e mais longos e outros longos.... Pareciam intermináveis: faziam doer o corpo, colocavam o psicológico à prova... Mas a cada quilômetro que era acrescentado, a possibilidade da realização do sonho se aproximava e nos tornávamos menos inseguros...

E após falar tanto sobre  a maratona no facebook, de ter criado o blog, motivada pela realização deste sonho, eis que o grande final de semana chegou.... Encontro, na véspera, com amigos corredores. Alguns com o mesmo sonho da primeira maratona; outros, experientes, compartilhando suas vivências... E o domingo amanhece chuvoso, frio, tempo entristecido... Madrugamos para chegar à largada... Os corredores vão se juntando e, por mais frio que fizesse, o clima foi se esquentando entre nós... Conhecidos que chegavam, amigos que se abraçavam... E um longo caminho a ser percorrido... 

"... finalmente. Imaginei este dia durante todas as vezes em que tive esperança: (...). Tinha esperança, imaginava este dia e acreditava que não iria ter medo; repetia mil vezes para dentro de mim próprio: não irei ter medo, não irei ter medo: e via com nitidez, claramente, este instante, estes rostos. E acredito que todos os instantes em que imaginei este dia, juntos, somados, são mais longos do que este dia, mas acredito também que este momento, agora, é mais profundo, é um poço infinito e, se eu mergulhasse neste agora, demoraria a minha vida inteira a cair no seu tamanho..." (Cemitério de pianos, p.89).

É dada a largada.... 

"Afasto-me cada vez mais e sei que, daqui a quarenta quilômetros, regressarei. Afasto-me e aproximo-me. Quarenta quilômetros separam-me de estar aqui a ser outra pessoa. E quarenta quilômetros poderão ser toda a minha vida. Todo o tempo desde o momento em que nasci até ao momento em que morrerei dentro de um único momento que poderá ser quarenta quilômetros. O tempo não saberá de mim. Serei outro. Desconhecerei a distância do tempo" (Cemitério de pianosp. 94-95).

Eu tive o privilégio de estar sempre acompanhada por amigos... Cada um vencendo suas barreiras, mas todos com um objetivo em comum... Os quilômetros foram sendo  "derrubados", como gritava meu amigo Sérgio Gonçalves, cada vez que passávamos por uma placa indicando a quilometragem... As passadas foram sendo dadas... E chovia e ventava... E chovia e ventava.... 

"... o som do vento a passar-me pelas orelhas, como o rugido do universo. Talvez como o som de passar por dentro do tempo, de atravessá-lo com o corpo inteiro: os braços e as pernas a atravessarem o tempo, o peito a atravessar o tempo e o rosto a levar toda a eternidade dentro de si" (Cemitério de pianosp.136).

E eu vencia uma maratona paralela - a que se passava em minha mente enquanto corria... Segurava-me para que minhas lágrimas não se misturassem com as gotas de chuva... pelo menos não no início da prova, já que, no final, sabia que seriam inevitáveis... E quando as dores começaram a aparecer, na casa dos 30km, foi esta maratona interior que me sustentou, pois as lembranças de tudo o que havia sido feito para chegar até ali, de todos os momentos de expectativa, de euforia, de superação, diziam-me que eu não podia desistir... A lembrança dos treinos e das superações diárias:

"Mas, quando ia treinar, passava pelas ruas a correr e ninguém podia imaginar o mundo de palavras que levava comigo. Correr é estar absolutamente sozinho. Sei desde o início: na solidão, é-me impossível fugir de mim próprio. Logo após as primeiras passadas, levantaram-se muros negros à minha volta. Inofensivo, o mundo afasta-se. Enquanto corro, fico parado dentro de mim e espero. Fico finalmente à minha própria mercê. (...) Foi então que aprendi a correr contra as palavras dentro de mim, da mesma maneira que aprendi a correr contra o vento" (Cemitério de pianosp. 129-130).

Eu sabia que, como a maioria daquelas corredores que passavam por mim, ou pelos quais eu passava, eu precisava encarar a dor e o cansaço e seguir em frente.... Eu sentia que só não cruzaria a chegada se algo muito sério acontecesse com meu corpo para me impedir... 

"... os corredores à minha volta (...). Têm nomes e têm infâncias. Sem voltar o rosto diretamente para eles, vejo seus vultos embaciados nas margens do olhar. Nessa mistura de manchas de cor, distingo que também eles não olham para ninguém. Assim como corremos nas ruas (...), corremos dentro de nós. Na meta, a distância e o peso desta maratona interior serão tão importantes  como os quilômetrso destas ruas (...). Enquanto levanto o pé para dar uma passada, o outro pé segura-se ao chão. Se o mundo parasse no instante em que tenho um pé levantado, a avançar, e outro pé assente no chão, poderiam crescer raízes a partir desse pé firme que me segura. Essas raízes poderiam entrenhar-se pelos intervalos de terra das pedras da rua, mas eu não deixo que o mundo pare. Depois de uma passada, outra, outra..." (Cemitério de pianosp. 144-145). 

E os quilômetros foram se somando.... Próximos do km 39, uma injeção de ânimo para o organismo e para o psicológico: avistei uma amiga, alguém que acompanhou toda minha metamorfose - desde minha quase obesidade até hoje - e que, portanto, sabe do significado daquela loucura que eu encarava... Ayeska Lovisi e um pedaço de rapadura... Brinquei com ela, por várias vezes às vésperas da corrida, pedindo-lhe que me levasse um pedaço de rapadura, já que ela estaria lá dando suporte para uma aluna que também faria a maratona pela primeira vez... E não é que a rapadura estava lá? Quando a gritei, num momento em que meu corpo pedia para eu parar de correr, e ela veio toda festiva com o pedaço de rapadura, foi emocionante... Não foi apenas o açúcar da rapadura que me injetou forças para acabar a corrida... Foi o encontro... Como costumo dizer, apesar de cada corredor ter seus objetivos particulares, apesar de cada um ter que vencer sua corrida subjetiva, os encontros, as amizades e as afinidades são o melhor da festa... A partir dali, foi só emoção: 40km... e chovia e ventava... 41km... e chovia e ventava... e havia um nó na garganta... 42km... e chovia e ventava... e, enfim, não contive mais minhas emoções...eu chorava... Os 195m restantes foram percorridos com o coração, com a emoção, com uma sensação que não dá para descrever... Somente quem sonhou, treinou, doou-se de verdade, sentiu medos e dores é capaz de entender essa sensação... E eu atravessei a linha de chegada... 

E havia água fria pelo chão e  pelo corpo, e gotas de água quente escorrendo pelo rosto...



Não posso terminar este texto sobre a maratona sem falar de algumas pessoas em especial. Começo pela importância de Gedair Reis na minha preparação para esta "insanidade". Alguém que esteve presente, em grande parte do tempo virtualmente, incentivando-me, trocando comigo sua experiência de maratonista, ouvindo-me as queixas, os medos, as inseguranças... Tornamo-nos amigos, cúmplices, companheiros de dores e de sonhos... Esteve ao meu lado km a km, fotografou toda a corrida, fez da minha primeira maratona e da maratona de retorno dele, após a cirurgia no joelho, a NOSSA maratona... Nada no mundo me fará esquecer tudo o que você fez e faz por mim, Gedair!!! Perdoe-me as intransigências de uma alma feminina... 

Minha amiga Kátia Cristina: ontem a Yvone Berg deixou um comentário em uma foto minha no facebook e hoje faço das palavras dela as minhas para você:  "Tiro o chapéu e ainda ajoelho para aplaudir". Eu sei o quanto de superação física e emocional você teve que enfrentar para concluir esta maratona. Foi muito mais do que as bolhas nos pés e as lágrimas misturadas aos pingos de chuva... Se todos que ultrapassaram aquela linha de chegada são dignos de ser chamados de maratonistas, você então, minha amiga, é muito mais merecedora disso. Parabéns!!! Parabéns!!! Parabéns!!! Orgulho-me muito de ser sua amiga!!!!


Gleice Medeiros, sua linda: você entrou na minha vida numa brincadeira de troca de mensagens pelo facebook no início deste ano. E quem diria que viraria uma amizade como virou? Fotógrafa, corredora, menina, mulher, mãe, amiga... Uma Donna Moça de suor e poesia: suor transpirado nas maratonas diárias que enfrenta; poesia flagrada pelo olhar diferenciado que a vida lhe deu e a profissão apenas aguçou... Obrigada pelo apoio emocional, pelas acolhidas e por enfrentar a barreira de segurança da maratona para me dar aquele abraço tão caloroso!!!


Sérgio Gonçalves: alguém que foi chegando de mansinho, comentando uma foto aqui, outra ali... Sonhando o mesmo sonho... Lutando para vencer batalhas semelhantes... Confidente... Dirigiu uma campanha: "Diga não ao dramim, viaje de avião.", fazendo-me ver o mundo por outro ângulo bem diferente...rsrs... Obrigada pela força!!! Foi um prazer imenso correr a maratona quase toda a seu lado... E aquele cobertozinho no final? Dispensa comentários...


Foram muitas as pessoas que acompanharam meu sonho e estiveram comigo em alguns momentos virtuais e reais. Cada um sabe de sua participação... Agradeço a todos a torcida, o apoio, as palavras trocadas... Dou meus parabéns a todos os que concluíram esta maratona: pela primeira ou pela enésima vez. De fato, 42km não são para qualquer um, mas, para aqueles que transpiram SUOR E POESIA, com certeza são!!!!

Houve um sonho, várias renúncias, muita dedicação e, enfim, a realização...



"Porque a minha vontade tem o tamanho de uma lei da terra. Porque a minha força determina a passagem do tempo. Eu quero. Eu sou capaz de lançar um grito para dentro de mim, que arranca árvores pelas raízes, que explode veias em todos os corpos, que trespassa o mundo. Eu sou capaz de correr através desse grito, à sua velocidade, contra tudo o que se lança para me deter, contra tudo o que se levanta no meu caminho, contra mim próprio. Eu quero. Eu sou capaz (...). Porque a minha vontade me regenera, faz-me nascer, renascer..." (Cemitério de pianosp. 205). 



Referência completa do livro de onde as citações foram retiradas: PEIXOTO, José Luís. Cemitério de pianos. Rio de Janeiro: Record, 2008.